INVESTIMENTO CULTURAL
Quem nunca perdeu a noção de tempo e espaço quando envolvido
com algo que literalmente de entorpece?
Pois bem, penso que essa é uma fraqueza típica do ser humano.
Deixar tudo pra última hora, pagar pra ver, cometer as mais
clássicas falácias “Eu sei o meu limite”, enfim.
Certa feita, fui convidado para uma roda de choro em Brasília
com o fito de comemorar o aniversário de um grande amigo, também músico, mas
juiz federal de ofício.
E para tal pândega resolvi convidar a minha versão feminina
(leia-se, adicta inveterada em boa música e demais desígnios do gênero) para me
acompanhar.
Lá fomos nós, belos e fulgurantes. Aqui é importante
consignar que tal companhia é, por sua vez, a minha outra metade, minha melhor
amiga, confidente e protetora.
Andréia Marinho, de alcunha Beaju, advogada, hoje mãe e
esposa dedicada, conhecida no meio musical pelo bom gosto e pela voz imponente,
aveludada e de uma afinação absurda, foi quem me deu a honra de me acompanhar
naquele evento que seria o mais importante daquele ano.
Chegamos em Brasília, nos hospedamos na casa de um outro
amigo em comum e, imediatamente fomos “escalar aquela serra”.
Tudo perfeito!
Contudo, como éramos jovens e, como todo bom jovem que se
preze, estávamos desprovidos de pecúnia até mesmo para a nossa própria mantença. Mesmo
assim decidimos encarar aquela guerra.
Foram três dias maravilhosos de festa, com tudo que tínhamos
direito, desde ver e tocar com artistas de renome nacional até sermos
ovacionados por aqueles convivas.
Bem, dado certo tempo, um olhou pra cara do outro e disse: “Gastei
quase tudo que tinha, só restou a grana da passagem de ônibus”.
Eu, imediatamente retruquei: “Não esquenta, ainda tenho uma
reservinha aqui”!
Foi quando tudo começou.
Eu sempre fui meio sugestionado com algumas coisas, não
aguento pressão, melhor ainda, não aguento “DOIS VAMOS?, é pressão demais pra
minha cabeça.
Eis que fomos convidados a ficar para a resenha do quarto
dia.
Instantaneamente dissemos em um coro uníssono OPA! DEMOROU,
MEU NOME É PRONTO!
E lá ficamos.
No dia de irmos embora foi quando nos demos conta de que
havíamos torrado até o último centavo. Foi um choque!
Beaju, sempre precavida, disse que tinha um cartão de
crédito, que passaria a despesa das passagens no mesmo de depois “suicidaria”
para pagar.
Compramos as passagens e ficamos aguardando a saída do ônibus
pra Goiania.
Como foram quatro dias de festa, sem comer direito, bebendo
tudo que era líquido, nada mais normal macular a minha fisiologia.
Pois bem, comecei a entrar em trabalho de parto e fiquei
desesperado quando entrei no banheiro da rodoviária e deparei com o zelador do
mesmo.
Putz! Fudeu! Será que paga pra cagar?
Nem me toquei que aquilo ali era uma caixinha, imbuído de “toda
honestidade e inocência” do mundo saí desesperado procurando algum canto que
pudesse parir aquela criança.
Depois de vagar por aquela estação, notei, quase ao final
dela, um banheirinho bem surrado que ficava num canto próximo ao almoxarifado
daquele lugar.
Não pensei duas vezes,
caí dentro!
Haviam três reservados mas somente um tinha porta, foi nesse
que eu entrei.
Saquei o rolo de papel higiênico e forrei a tampa do bocão e
pulei em cima.
Para minha desventura a porta fechava mas não tinha trinco.
Beleza!
Sentei meio lado e com
a outra perna, na ponta dos pés segurei a porta. Foi uma batalha, vez que determinado
movimento que fazia para fechar a porta, sem perceber, com o peso da perna eu
também fechava o “registro”, e em meio a esse sofrimento todo , conseguia
liberar alguma coisa.
Antes de tudo isso, havia combinado com a Beajú, que se nossa
viatura estivesse partindo era pra ela
me telefonar.
Foi dito e feito! O telefone tocou, o desespero falou mais
alto, e naquela ginástica toda eu resolvi botar tudo pra fora de uma única vez. Pensem no tamanho da força que
eu fiz, foi quase a mesma de um parto natural, achei que teria um aneurisma.
Dada a situação já descrita anteriormente, aquilo tudo quando
saiu fez um barulho ensurdecedor, parecido com uma freada de caminhão.
Brasília, como se sabe, é uma cidade cosmopolita, terra
prometida, 90% de sua população é de nordestinos. Assim ao ouvirem aquele som
nefasto, a galera que estava de dentro começou a gritar “EITA DIABO! ESSE FICOU
TODO ARROMBADO!”...
Foi foda.
Como eu havia me preocupado com a assepsia do bocão, nem
tinha me dado conta que o papel acabara, foi quando resolvi usar a minha meia.
Passei pelo que passei em nome da música e quando vinham me
dizer que eu não devia ter gasto tanto assim eu imediatamente dizia: “Ah!Estou
fazendo investimento cultural!”
Luciano Maia